segunda-feira, 30 de maio de 2016

Desemprego em xeque

Publicado em 29/05/2016 às 07h00.

Solenidade e desemprego

Em plena festa de colação de grau, formandos publicam selfies chamando a atenção para a falta de emprego

Liliana Peixinho

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Imagem ilustrativa / Reprodução (internet)

A família madruga para chegar ao trabalho em transporte desumano, não consegue acessar recursos de financiamento público universitário, passa o maior sufoco para tentar pagar contas básicas de luz, condomínio, água, supermercado, engana o estômago com porcarias, em correria na rua, faz o maior sacrifício para pagar as mensalidades da solenidade de formatura do filho, como um sonho, e no dia da festa de gala, os formandos publicam selfies nas redes sociais cuja legenda ironiza a disputa de espaço, na foto, como recém-formados em cenário de desemprego.
Ao ler uma legenda assim, descrita por um grupo de formandos antenados na realidade social brasileira sobre incapacidade do país em acolher novos profissionais, senti tristeza por, depois de anos acompanhando histórias de vidas dedicadas a sonhos, vê-las agora, interrompidas pela onda de desemprego crescente. Se para um jovem, de 23, 24 anos, é uma realização a formatura como símbolo de perspectiva para novos horizontes de vida, espaço para aplicação dos conhecimentos adquiridos em dedicação aos estudos; o trabalho, o emprego, a remuneração pelo desempenho da atividade, deveria ser garantia, como recompensa aos anos de dedicação e investimentos financeiros na formação profissional. Mas o sonho virou pesadelo.
Exatamente porque é entre os jovens que a escalada de desemprego faz o maior estrago, que a tristeza aumenta. E a gravidade, conforme análises de  especialistas, é que esse cenário pode deixar, em alguns anos, um grupo de pessoas sem trabalho, e sem experiência, para conquistar espaços adequados às suas qualificações e aspirações. Assim vemos por ai fisioterapeutas que tentam vender roupas; economistas em atendimentos call center; psicólogos em disputas de espaços em táxis, administradores que empreendem em food-trucker, e um sem-fim de desafios em arranjos criativos sem nenhuma garantia de sustentação num mercado abalado, sem credibilidade.

A taxa de desocupação entre jovens de 18 a 24 anos foi a que mais cresceu entre os grupos etários


Embora o desemprego entre os jovens sempre apresentem taxas mais altas que em outros grupos, o que surpreende é a velocidade apresentada em cenários mais recentes. Informação dá conta que  “O salto na taxa de desemprego nessa faixa etária foi de 4,7 pontos percentuais em relação a 2014, enquanto a média geral da população das grandes metrópoles foi de dois pontos percentuais”. A taxa de desocupação entre jovens de 18 a 24 anos, segundo dados do IBGE, ficou em 16,8 em 2015, e foi a que mais cresceu entre os grupos etários. Dados preocupantes num cenário político econômico que brada por mudanças e faz é tempo. Essa garotada sedenta por justiça social e vontade em trabalhar e contribuir para um Brasil justo, não merece entrar para a história como uma “geração perdida”.
Hellen, Icaro, Juliana, Bianca,Thais, Milena, Veronica, Harrisson e tantos outros jovens profissionais, olha, o mundo, quem sabe, dará boas voltas e em nome dos esforços despendidos por cada um possamos ter esperanças para as atuações que vocês querem e precisam realizar. Saibam que vocês nâo estão sozinhos e muitos profissionais qualificados, experientes, super graduados, estão por aí, diversificando atividades pra driblar os efeitos de uma crise que. tenham certeza, cada um de nós teve a sua contribuição ao escolher,  acreditar e votar em promessas de representantes não cumpridores de suas palavras. E que a realidade nos sirva de exemplo para ver que rumos queremos dar a gerações que, como a de vocês, não se sintam perdidas, sem representação nos ambientes de decisões do país.

liliana campanha permanente desde 199 D zero camisa pretaLiliana Peixinho  é jornalista, ativista, fundadora da Rede de Ativismo em Jornalismo e Ambiente (Reaja), movimento Amigos do Meio Ambiente (AMA), Mídia Orgânica, e outras mídias alternativas. Especializada em Jornalismo Científico e Tecnológico.

E nossos direitos!

Publicado em 15/05/2016 às 08h15.

Brasil em direitos negados

Num momento em que o país passa por mudanças no comando central, há sinais de que pouco (ou nada) mudou para o cidadão brasileiro comum

Liliana Peixinho

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Imagem ilustrativa (Foto: Blog Cleber Miranda)

Num país onde o povo fica horas em filas, seja para esperar ônibus lotados e sem segurança, tentar disputar uma dose de vacina contra vírus mortais, lutar por uma vaga em creche pública, agendar um horário no INSS para uma perícia médica e esperar meses e meses para ouvir um não a benefícios negados a quem não pode andar nem usar as mãos. Num país onde as leis elastecem mordomias, mas restringem direitos básicos como acesso a água limpa e esgoto sanitário. Num país onde se prende quem rouba uma fruta e deixa solto quem sucateia as riquezas naturais; onde se fica rico de um dia pro outro, mas se perpetua a miséria em engodos sociais; onde se sai de casa em labuta diária, sem a garantia de volta para a família, o que esperar desse país, cujas composições ministeriais, historicamente, são responsáveis por esse quadro de desigualdade social?
Quanto tempo (anos, décadas) será necessário para se restabelecer um país, cujos bens patrimoniais – como o Rio Doce, o Velho Chico, a Amazônia, o Cerrado, a Caatinga, a Mata Atlântica, os bancos de fomentos – e as comunidades tradicionais indígenas, quilombolas, agricultores familiares, artesãos, pescadores, são explorados em nome da expressão sustentável, em conceito desgastado, mal utilizado, sem prática real da necessidade entre produção e consumo?
O que esperar de um país que se vangloria de políticas econômicas cujas commodities agrícolas registram imagens áreas de uma terra em monoculturas transgênicas ou plantios envenenados em agrotóxicos? Um país que mata na mesa e resiste em mudar sistemas produtivos desumanos, insanos, indignantes, em estado similar ao da escravidão de mão de obra? O que esperar de um sistema onde o faz de conta ainda engana, seduz cidadãos que não perdem a esperança em discursos rasos, falhos, comprovadamente criminosos, como os apurados na Operação Lava Jato?

Se alguns continuam com tantas regalias, o

que esperar do país, seja em que governo for?


O que esperar de um país onde recém-formados fazem fotos como futuros desempregados e sabem que toda a criatividade, coragem e conhecimento não serão suficientes para enfrentar uma crise onde mais de 10 milhões de trabalhadores, muitos experientes e bem preparados, amargam a agonia de não poder pagar contas básicas como luz, água, condomínio, transporte?
O que esperar de um novo governo, com práticas de velhas políticas, excludentes, concentradoras de renda, cegos a anseios de direitos básicos como moradia decente; e que paradoxalmente, imprime, sustenta, garante um sistema que privilegia mansões desocupadas enquanto espreme famílias numerosas em casinhas sem estruturas mínimas como esgoto sanitário, transporte decente ou posto de saúde que cuide da vida, antes da morte?
O que esperar de um sistema político, historicamente viciado em corromper o porteiro, a merendeira, a secretária, o professor, o diretor, com escolas onde até o alimento para os alunos, é desviado, superfaturado? Para os sem partidos, sem representação política, sem rabo preso, que resistem ao mais de mesmo, ao faz de conta, a cenários de selfies rasas, em práticas de ostentação egoístas, o Brasil dá sinais de que vai demorar a se recuperar.
Temos escutado por ai que há esperança. Essa pode ser para os netos e bisnetos de uma geração que muito lutou para ver o país, não concentrador de renda, mas que pudesse espalhar, distribuir, compartilhar sua riqueza com todas as camadas sociais, sem privilégios desse ou daquele grupo social, mas, em especial, para os que, historicamente pagam uma conta alta por acreditar em promessas de vida fora do faz de conta, em mudanças reais e de direitos, que continuam negados e até quando? Se vereador, deputado, senador, presidente, funcionário público dessa ou daquela instituição, continuar com regalias como foro privilegiado, assessores, moradia, salários, assistência médica e tudo o que um ser humano precisa, em detrimento de outros, que nem mesmo podem pagar pela morte matada, em dados que falam em cerca de 50 mil homicídios por ano. O que esperar desse país, seja em que governo for?

liliana campanha permanente desde 199 D zero camisa pretaLiliana Peixinho é jornalista, ativista, autora de “Por um Brasil Limpo”. Fundadora da Rede Ativista de Jornalismo e Ambiente (Reaja), do Movimento Amigos do Meio Ambiente (AMA), da Mídia Orgânica e outras mídias alternativas. Vencedora Prêmio Shift – Agentes Transformadores – 2015.